ATA DA QUADRAGÉSIMA PRIMEIRA SESSÃO SOLENE DA QUARTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA PRIMEIRA LEGISLATURA, EM 10.12.1996.

 

Aos dez dias do mês de dezembro do ano de mil novecentos e noventa e seis, reuniu-se, na Sala de Sessões do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezenove horas e vinte e nove minutos, constatada a existência de "quorum", o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Senhor José de Jesus Peixoto Camargo, nos termos do Requerimento nº 40/96 (Processo nº 830/96), de autoria do Vereador João Dib e aprovado pelo Plenário. Compuseram a Mesa: o Ver. Fernando Záchia, 1º Secretário da Casa no exercicio da Presidência, o Senhor José de Jesus Peixoto Camargo, homenageado, o Senhor Roberto Coral, Diretor do Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre, representando o Senhor Prefeito Municipal de Porto Alegre, o Deputado Francisco Appio, Representante da Assembléia Legislativa do Estado, o Senhor Paulo Leandro da Rosa Silva, Representante do Comando Geral da Brigada Militar e o Doutor Nelson Porto, Provedor da Santa Casa de Misericórdia. Como extensão de Mesa, o Senhor Presidente registrou as seguintes presenças: Deoclécio e Zeli Camargo, pais do homenageado, Marília, sua esposa, Camila e Fábio, seus fllhos, Vera, sua nora e a Senhora Maria de Lurdes, sua sogra. Em seguida, foi registrada a presença dos Vereadores de Vacaria, Senhor Dilermando Schiller e Senhor Osvaldo Constanzi Filho. Logo após, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, assistirem à execução do Hino Nacional. Em prosseguimento, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao Ver. João Dib para que se manifestasse na presente homenagem como proponente e por todas as Bancadas da Casa. O Ver. João Dib teceu considerações sobre a importância de uma homenagem desta, discorrendo à respeito do orgulho de ver o Senhor José de Jesus Peixoto Camargo recebendo esta homenagem fora de Vacaria, sua terra natal. Em continuidade, o Senhor Presidente convidou o Senhor Roberto Coral, representando o Prefeito Tarso Genro, para que fizesse a entrega do Diploma Alusivo ao Título ao Homenageado. Logo após, foi entregue ao homenageado a Medalha de Porto Alegre pelo Senhor Nelson Porto. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra ao homenageado, que agradeceu a presente homenagem muito emocionado. Em prosseguimento, o Senhor Presidente entregou ao homenageado o livro "Porto Alegre à Beira do Rio e em Meu Coração". Às vinte horas, nada mais havendo a tratar, o Senhor Presidente agradeceu a presença de todos e declarou encerrados os trabalhos da presente Sessão, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Ver. Fernando Záchia e secretariados pelo Ver. João Dib, como Secretário "ad hoc". Do que eu, João Dib, Secretário "ad hoc", determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada pelos Senhores 1º Secretário e Presidente.

 

O SR. PRESIDENTE (Fernando Záchia): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão destinada à entrega do Título Honorífico de Cidadão de Porto Alegre ao Dr. José de Jesus Peixoto Camargo, por proposição do Ver. João Dib.

Convidamos para sentar à Mesa o Dr. José de Jesus Peixoto Camargo, nosso homenageado; o Dr. Roberto Coral. Diretor do Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre, representando o Sr. Prefeito Municipal de Porto Alegre; o Deputado Francisco Appio, representante da Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul; o Capitão Paulo Leandro da Rosa Silva, representante do Comando Geral da Brigada Militar, e o Dr. Nelson Porto, Provedor da Santa Casa de Misericórdia.

Convidamos a todos os presentes para, em pé ouvirmos a execução do Hino Nacional.

 

(É executado o Hino Nacional.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos, como extensão da Mesa, os pais do homenageado, Deoclécio e Zeli Camargo; sua esposa, Marília; seus filhos, Camila, Fábio; sua nora, Vera; a Sra. Maria de Lurdes, sogra do homenageado.

Registro, também, a presença dos Vereadores de Vacaria, Sr. Dilermando Schiller e Sr. Osvaldo Constanzi Filho.

O Ver. João Dib, proponente da homenagem, está com a palavra. Falará em nome do PPB e de todas as Bancadas da Casa.

 

O SR. JOAO DIB: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Tenho 26 anos de Câmara Municipal e, ao longo desses 26 anos, três vezes vim à tribuna porque havia proposto um Título de Cidadão de Porto Alegre. Esta é a terceira vez. Esta é uma vez que venho com mais satisfação, porque a proposição, é claro, deveria ser de um Vereador, mas a proposição não foi só minha, foi da cidade de Vacaria, foi do povo de Vacaria, através daquelas pessoas que aqui residem e que, conhecendo as qualidades do nosso homenageado, acharam que ele tinha que ser Cidadão de Porto Alegre. E eu não tinha dúvida nenhuma que merecia, por todos os títulos.

O nosso homenageado é médico, de renome nacional e internacional; é professor; tem mestrado em pneumologia, tem troféus; tem prêmios; tem títulos; tem trabalhos extraordinários. Mas isso eu não tenho necessidade de lembrar, porque os que aqui estão são seus amigos e sabem que ele merecia a homenagem que a Câmara, por unanimidade, lhe deu, e que o Prefeito de Porto Alegre sancionou.

Eu confesso que tinha dificuldades, além de dizer da minha alegria de filho de Vacaria, com tanto tempo neste Legislativo, de sentir parte desta homenagem que lhe é outorgada, Dr. Camargo, porque acho que cada um de nós que nasceu em Vacaria também sente com V. Sª. o orgulho de ver um filho da nossa terra ser reconhecido fora dela. Isso é muito bom para todos nós.

Há poucos dias eu lia um artigo: "Medicina, escolha de paixão". E dizia o nosso homenageado que, entre profissionais igualmente treinados, sempre vencerá aquele que colocar uma dose de paixão no que faz. Isso é realmente importante. Há algum tempo atrás, ouvi uma história, a qual dois pedreiros trabalhavam na construção de uma parede. Um cantava e o outro praguejava. Os dois faziam o mesmo trabalho. Uma pessoa curiosa perguntou ao que praguejava: "o que é que o Sr. está fazendo?" "O Sr. não vê que eu estou fazendo uma parede?", falou grosseiramente. Aí ele perguntou ao que cantava: "O que é que o Sr. está fazendo?" Ele parou de cantar, mas disse quase cantando: "estou construindo uma catedral." Então, o nosso homenageado é um homem que constrói catedrais, se preocupa com a sua coletividade e põe paixão no seu trabalho, que realmente é importante, e eu entendi perfeitamente a frase que havia destacado. Ninguém é homenageado sozinho, por isso, quando da saudação ao querido amigo, fiz questão de colocar o nome da Dona Marília. Na verdade, para que as coisas boas ocorram, para que possamos trabalhar com tranqüilidade, é preciso que haja um apoio permanente, e não tem apoio melhor do que a nossa família. Quando chegamos em casa, tumultuados pelo dia de trabalho, pela operação que foi difícil, pelo cansaço que toma conta de nós, vem uma Dona Marília sorridente e diz "vai ser melhor hoje; amanhã vai ser melhor ainda", e aí o cansaço desaparece, até porque o Fábio e, agora, a Vera se somam e batem palmas e dizem "pai, estava tudo certo". Então, a Camila completa tudo. A Camila quando sorri as coisas ficam excelentes. Então, a solenidade que hoje se realiza se deve em parte à Dona Marília, ao Fábio, à Vera, à Camila e aos nossos amigos que em horas difíceis também estimularam o nosso homenageado. Eu teria que destacar uma qualidade desta figura extraordinária que hoje está sendo homenageada, e eu faço com muita facilidade. Eu tenho um apreço muito grande pela família, mas eu acho que ninguém é nada na vida se não for um bom filho. Isso eu acho uma qualidade que teria justificado tudo, para mim, daquilo que hoje está acontecendo, que é esta homenagem que o amigo está recebendo. Eu quis que essa homenagem fosse realizada antes e o Dr. Camargo me mandou um bilhete, dizendo que gostaria que fosse transferida. Diz no bilhete: "Eu gostaria, a respeito das datas que é a outorga do título, e preferi postergar um pouco para que meu velho pai, atualmente com 81 anos, pudesse comparecer." Eu sei o quanto o seu Deoclécio e a Dona Zeli tem de satisfação com todas as vitórias de seu filho. É extremamente importante. Esta convicção de que eu tinha escolhido e aceito a sugestão de Vacaria para homenageá-lo se tornou maior, porque volto a dizer: ninguém que não seja um bom filho é um bom homem, e não sendo um bom homem não é uma figura que sirva para a coletividade. Então, além de ser um profissional competentíssimo, reconhecido em Porto Alegre, no Brasil, fora do Brasil, é um bom filho. Isso eu acho uma coisa extraordinária. E é esse o destaque que faço dessa pessoa, dessa personalidade que é hoje homenageado, nosso Dr. José de Jesus Peixoto Camargo.

Para concluir, digo que vejo também nele um homem simples, que não faz alarde das suas qualidades, das suas vitórias na Medicina, das suas vitórias no trabalho em que ele colocou toda a sua paixão, e poderia dizer que o nosso José de Jesus Peixoto Camargo tocou as estrelas pelas tantas coisas boas que fez e pelas que vai fazer ainda, mas nunca tirou os pés do chão. Faço votos que ele continue sendo como é, e pode ter certeza que Porto Alegre, quando o homenegeia, lhe diz que espera mais ainda, confia, tranqüilamente, que o nosso homenageado vai engrandecer mais Porto Alegre e também a nossa Vacaria. Saúde e paz para todos. Muito obrigado. (Palmas)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Solicitamos que o Dr. Roberto Coral, Diretor do HPS, representando o Prefeito Tarso Genro, faça a entrega ao nosso homenageado do Diploma da Cidade de Porto Alegre.

 

(É feita a entrega do Diploma. Palmas.)

 

Solicitamos ao Dr. Nelson Porto, Provedor da Santa Casa de Misericórdia, que faça a entrega ao nosso homenageado da Medalha de Porto Alegre.

 

(É feita a entrega da Medalha. Palmas.)

 

Com a palavra o nosso novo Cidadão, Dr. José de Jesus Peixoto Camargo.

 

O SR. JOSÉ DE JESUS PEIXOTO CAMARGO: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa.) Autoridades presentes e representadas, minhas Senhoras, meus Senhores, meus caros amigos. (Lê.)

"Numa madrugada de fevereiro, há 36 anos atrás, meu velho pai, com o olhar fugidio e o queixo trêmulo, me abraçou na estação rodoviária da minha amada Vacaria, e tendo por parceiro um conterrâneo da mesma idade, e igualmente assustado, partimos rumo a cidade grande, para fazer um exame de suficiência que nos permitiria a matrícula no Colégio Rosário.

Lembro da preocupação com os papéis e da garganta seca por medo do desconhecido.

Recordo do impacto da entrada na Farrapos, a primeira avenida engarrafada da minha vida. Depois a descida na Rua da Conceição e a busca de um hotel que ficasse por perto.

Ainda hoje sinto uma ponta de nostalgia e de saudade do simplorismo com que decidimos, no dia seguinte, abandonar o Hotel São Luiz, por considerá-lo caro, e conseguimos um hotelzinho bem mais barato ali no início da Voluntários da Pátria, onde, há 30 anos, ainda se permitia que adolescentes transitassem por ali, com uma segurança que perdemos. Ainda sem saber que cada cidade tem o seu, me encantei com o cheiro de Porto Alegre naquele primeiro amanhecer, e não importa aonde eu vá nem quanto tempo fique fora, tragam-me aqui de olhos vendados, e eu saberei que voltei para casa.

Na fase de namoro com a cidade, percorri todas as ruas que tinham trilhos e me encantei com as faíscas que os bondes produziam nas curvas apressadas, e descobri logo o fascínio de saltar deles ainda em movimento.

O meu amor pela cidade cresceu sem parar e se refinou na passagem pela Universidade, quando descobri que a noite ameniza os corações e permite idealizar coisas que parecem menos prováveis com a luz desmistificadora do sol.

Mas não tenbo dúvida de que o mundo seria melhor se tivessem vingado as reformas que planejamos nas noites solidárias do bar Alaska.

Antes de terminar o curso de Medicina, e ainda como interno no Hospital de Pronto Socorro, encantei-me com uma cirurgia de tórax e saí a cata de um lugar onde pudesse aprendê-la.

Foi assim que cheguei ao Pavilhão Pereira Filho, e começamos sem saber uma paixão arrebatadora que já consumiu 28 anos da minha vida e tem, de muitas maneiras, contribuído para justificá-la.

Lá encontrei o José Moreira um primeiro e definitivo amigo, e através dele cheguei perto do Nelson Porto, uma figura de início meio assustadora porque sabia demais, mas que logo se revelou um grande mestre, conselheiro de todas as conquistas e inalcançável modelo de todos nós. Sou grato a ele pelo jeito paternal com que sempre tolerou minha irreverência, e pela dificuldade de disfarçar uma quase lágrima quando faço ou digo alguma coisa que ele, generosamente, julga que valeu a pena.

No Pavilhão conheci a Ivan Faria Correa, um mestre de temperamento imprevisível, mas fiel e generoso amigo de seus amigos.

Enquanto trabalhamos juntos, me encantei com sua técnica e habilidade, e gastei muitas horas tentando reproduzir os gestos que o distinguiam como um exímio cirurgião.

Recordo o dia da minha primeira cirurgia de traquéia, quando ele me abraçou no vestiário e meio comovido e meio debochado admitiu que eu era menos ruim do que inicialmente aparentara.

Em cada uma das exultações que a vida me concedeu depois disso, eu sempre lembro dele, de pura saudade.

Recordo, com dor no coração, ele já doente, se fardando para me auxiliar e tentando transmitir, apressado, todas as coisas importantes que aprendera nas suas andanças de pioneiro.

Guardo como herança dele o aprendizado de que a maioria das pessoas anseia por paz, mas existem aquelas para as quais a felicidade é apenas um ponto de equilíbrio no máximo de tensão.

Quando terminava a residência médica, assolou-me a idéia de ter que trabalhar em outra cidade, e abandonar a minha já muito amada Porto Alegre. Por isso, quando o mestre Ivan convidou-me para continuar no Pavilhão Pereira Filho, senti uma vontade incontrolável de caminhar pelas ruas e de alguma maneira dizer para elas, que agora sim, seria para sempre.

Desci a Rua da Praia até a Praça da Alfândega, depois subi a Ladeira até a Praça da Matriz e senti uma vontade enorme de contar para as pessoas a causa de meu encanto, e acabei descobrindo, naquele dia, que as maiores alegrias, à semelhança das maiores tristezas, são inevitáveis exercícios de solidão.

Quando o mestre Ivan morreu, assumi a chefia do departamento de cirurgia, com a angústia e a insegurança de escassos 31 anos de idade, mas, alavancado pelo apoio permanente e otimista de Bruno Palombini e Nelson Porto, encontrei em José Antonio Figueiredo Pinto e Artur Burlamaque parceiros mais fiéis para compartir todas as dificuldades, muitas delas multiplicadas pela fantasia da inexperiência. Mas foi, sem dúvida, uma fase construtiva, profícua e bem humorada da minha vida.

Aprendi com meu avô que ninguém é obrigado a ser o primeiro, mas temos obrigação, sim, de fazer com este intrometido bata todos os recordes, e por isso festejei muito a aceitação para um estágio de aperfeiçoamento na Clínica Mayo, o que deveria significar uma expansão de horizontes.

Guardo viva na memória, a noite insone, o Fábio ressonando no meu colo, a Marília fazendo de conta que dormia, a angústia da chegada, o impacto de um mundo novo, e a descoberta de que a maior solidão é não conseguir expressar os sentimentos.

Lá encontrei o Professor Spencer Payne, uma das pessoas mais importantes de minha vida, um modelo que tentei desesperadamente copiar e não consegui. Nunca esquecerei um dia em que ele, tendo recebido a notícia da morte de um amigo querido, seguiu operando maravilhosamente enquanto esperava a hora de tomar o avião e acompanhar o resgate do corpo. Comovido com o seu sofrimento de alternar operações irretocáveis com lágrimas derramadas no vestiário, ofereci-me para substituí-lo numa das operações a seguir e ele me disse: "Obrigado, meu caro Dr., mas se eu conseguir operar todos os pacientes agendados, hoje à noite eu vou ter para lamentar apenas a morte do meu amigo".

Aprendi com ele que nós somos apenas o que fazemos, e na extensão máxima da responsabilidade que isto represente.

Convidado a ficar por lá, e a tocar adiante o projeto experimental de transplante que iniciáramos, me descobri um aborígine irrecuperável, com raízes profundas demais para serem assim transplantadas.

Com a cabeça ambivalente mas o coração saudoso voltamos para encontrar a Santa Casa no seu pior momento, a aumentar ainda mais a dúvida da decisão.

E os projetos só deixariam de parecer quimeras depois da chegada de João Polanczyk e seu grupo, determinados a transformar um hospital em ruínas neste modelo que hoje orgulha a medicina gaúcha e brasileira. Terei sempre pelo João a justa gratidão dedicada às pessoas que viabilizaram os nossos sonhos.

Obcecado pelo projeto do transplante e convencido de que quando a mente humana é expandida por uma idéia nova ela nunca mais volta ao tamanho original, começamos a longa preparação que serviu para expor todas as nossas pobrezas e limitações.

Consciente de que tenho menos coragem do que gostaria, tive o cuidado de montar uma estrutura que, chegada a hora, não permitisse recuos. E foi gratificante descobrir a energia indispensável brotando do entusiasmo de pessoas jovens e vibrantes.

E quando a Dona Liduína, a faxineira do bloco cirúrgico, alertada da possibilidade de transplante voltou para o hospital e ofereceu-se voluntariamente para um plantão noturno porque considerava lisonjeira a faxina do bloco do primeiro transplante de pulmão da América do Sul, nós descobrimos que estávamos prontos e em boa parceria.

Nunca esquecerei a madrugada de 16 de maio de 1989, quando o Dagoberto e eu atravessamos o pátio escuro do velho Hospital São Francisco, em silêncio absoluto, com um pulmão incerto numa bacia trêmula, mil perguntas na cabeça, todos os medos no coração e uma única certeza: acontecesse o que acontecesse, nós nunca mais seriamos os mesmos.

Quando o dia amanheceu radioso e o Vilamir acordava fazendo sinal de positivo, o Felicetti ameaçou com um velho champagne para comemorar, mas quando o Marcelo e a Maria Eunice alertaram que ainda era muito cedo para festejar, o champagne voltou para o refrigerador, e na falta de um instrumento de comemoração convencional, fungamos abraçados como irmãos que sempre fomos.

Depois disso parece que perdemos a senha de acesso a emoções pela metade, pois foram grandes alegrias entremeadas com perdas irreparáveis, como convém a quem ousa trabalhar com o desespero e, pretencioso, se expõe aos riscos de representar a última esperança.

Conheci nestes últimos anos os limites do sofrimento humano, aprendi o quanto uma cabeça determinada a viver pode manter em pé um esqueleto ofegante e o quanto dói uma perda depois de uma luta obstinada e inútil.

Não creio que exista trabalho médico mais exigente de obstinação nem mais revelador de nossas fraquezas e incompetências.

Por isso sou grato às pessoas que, apesar de todas as dificuldades, seguem acreditando que, se não podemos mudar esta caricatura de saúde pública que avilta o trabalho médico, precisamos seguir fazendo o que sabemos fazer, e do melhor jeito que conseguirmos.

Quanto mais não seja para envelhecermos com a sensação de que pelo menos fizemos a nossa parte.

E se tem que ser assim porque é só assim que sabemos ser, eu prefiro que esta homenagem seja considerada apenas como uma pausa para reabastecimento do nosso estoque de esperança e uma alavanca para recomeçar.

Para finalizar, devo mais do que nunca agradecer a todas pessoas que embalaram as minhas quimeras, estimularam meu crescimento, toleraram a minha inquietude e viabilizaram meus sonhos.

Sou grato e eles sabem o quanto, aos meus pais, pelo exemplo de dignidade e determinação, aos meus irmãos pelo estímulo permanente, aos meus amigos pela tendenciosidade que não lhes permite perceber que esta homenagem é um exagero, e de um modo muito carinhoso à minha mulher porque sem ela eu não teria sido e aos meus filhos, que sem eles eu não teria porquê.

Sou especialmente grato ao Ver. João Antonio Dib e não sei o que me sensibilizou mais, se o Título de Cidadão de Porto Alegre ou se a indicação ter surgido espontaneamente de alguém que representa um símbolo tão inquestionável de austeridade e de respeito.

Obrigado Ver. João Dib por esta honrosa distinção que marcará definitivamente a minha vida, e obrigado aos seus colegas Vereadores por esta alegria inesquecível.

Lembrarei para sempre deste momento grandioso que alegrou o meu coração e colocou este brilho nos olhos dos que me amam. Muito obrigado."

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Passamos às mãos do Dr. José Camargo uma singela recordação da Câmara Municipal, que é o livro comemorativo aos dez anos desta Casa, que tem o titulo "Porto Alegre à Beira do Rio e em Meu Coração", dos poetas Luiz Coronel e Luiz de Miranda. A este novo Cidadão de Porto Alegre um reconhecimento unânime desta Casa, que deve estar feliz pela homenagem e pelo reconhecimento da Cidade. Como o homenageado mencionou, ele é um homem feliz, porque recebeu por indicação do Ver. João Dib, que para nós políticos mais novos é um homem que representa a honradez política, credibilidade que tanto se fala a respeito da classe política. E, Ver. João Dib, aí eu faço pessoalmente uma homenagem, nós, que estamos num caminho político com tanta dificuldade: o exemplo de V. Exa. nos estimula para que possamos prosseguir nessa luta de termos uma Porto Alegre melhor com esse novos cidadãos que tão bem representam a nossa Cidade. Muito obrigado.

Estão encerrados os trabalhos.

 

(Encerra-se a Sessão às 20 horas.)

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